O conflito entre a Rússia e a Ucrânia movimentou diferentes campos da política brasileira e expôs, curiosamente, posicionamentos confluentes entre parte dos apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) e grupos de oposição, principalmente na defesa de Vladimir Putin. Outra fatia dos bolsonaristas optou por condenar a ofensiva russa e defender o país atacado, evidenciando uma divisão na bolha ideológica do entorno do presidente.
Liderada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (Patriota-RJ), uma ala usa o confronto para defender o ex-presidente americano Donald Trump. O parlamentar disse em uma publicação nas redes que o político dos EUA deveria ganhar um “Nobel da Paz” por ter supostamente evitado guerras em seu mandato.
Assim como o chefe do Executivo, Eduardo é um admirador declarado de Trump e já chegou a se encontrar com o ex-estrategista-chefe da Casa Branca no governo do republicano, Steve Bannon, sob a prerrogativa de presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Durante o mandato de Trump, Eduardo também foi cogitado como embaixador brasileiro em Washington.
“Trump foi um raro caso de Presidente dos EUA que não entrou e evitou guerras. Num mundo normal ele receberia o Nobel da Paz”, escreveu o deputado, que também compartilhou uma imagem de Trump dando um aperto de mão no ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un.
O perfil “Patriota”, uma página bolsonarista com mais de 300 mil seguidores nas redes sociais – seguida até mesmo por Michelle Bolsonaro – recebeu cerca de 6 mil curtidas em uma postagem que atribui a manutenção da paz mundial à dupla Trump e Bolsonaro: “Reinava a paz quando, juntos, Bolsonaro e Trump lideravam o mundo livre”, diz a publicação.
Outro perfil de apoio ao chefe do Executivo opinou que a “esquerda” estaria hesitando em admitir a suposta habilidade de Trump para evitar conflitos no leste europeu. “A Rússia invadiu a Crimeia no tempo do Obama e a Ucrânia no tempo do Biden”, diz a postagem.
Opiniões sobre Biden coincidem
Em uma situação rara, ao responsabilizar o presidente Joe Biden pelo conflito, bolsonaristas coincidem com a opinião de alguns políticos de esquerda. O perfil oficial do PT no Senado fez uma publicação no Twitter defendendo a Rússia e condenando o que chamou de “comportamento imperialista” dos Estados Unidos. Segundo a publicação, a Rússia estaria se defendendo da “política belicosa” adotada pelos americanos por meio da Otan. A postagem foi excluída após alguns minutos.
Ao comentar o assunto, a ex-candidata à vice-presidência na chapa de Fernando Haddad (PT), Manuela Dávila, disse que as preocupações da Rússia são “legítimas” e defendeu que a Otan diminua o cerco às fronteiras do país. O presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, também culpou Biden pelo ocorrido. Reagindo a uma postagem do presidente americano, ele escreveu: “Você realmente acredita que seu governo não tem qualquer responsabilidade por essa crise depois que tentou levar a Ucrânia para a Otan? Você também é culpado por essa situação!”.
O PCdoB, por sua vez, compartilhou um artigo afirmando que “a única coisa que poderia ter demovido a ação militar em larga escala seria a aceitação por parte dos Estados Unidos e da Otan” das condições impostas por Putin. A secretária de relações internacionais do partido, Ana Prestes, fez uma publicação atenuando a responsabilidade do presidente russo pelo ataque. “Existe um ator que foi fundamental para minar qualquer possibilidade para se chegar a um acordo diplomático: EUA. Preferiram instigar e investir na beligerância via expansão da OTAN”, escreveu.
Sem mencionar o presidente americano, o provável candidato do PT ao Planalto, Luiz Inácio Lula da Silva, criticou a atuação da Organização das Nações Unidas (ONU) no apaziguamento do conflito e disse que a agência perdeu representatividade. “É importante a gente chamar a atenção das Nações Unidas. As Nações Unidas precisam levar em conta que elas não têm mais a representatividade que tinha quando ela foi criada em 1948. É importante ela lembrar que a geografia política do mundo mudou”, disse o ex-presidente, defendendo que mais países tenham representação no conselho de segurança do órgão.
Vale ressaltar que o presidente Bolsonaro manifestou solidariedade à Rússia em sua viagem oficial ao país e tem evitado condenar a postura de Vladimir Putin.
Entretanto, outra parcela de aliados e ex-aliados do presidente condenam a Rússia e defendem a Ucrânia. O ex-chanceler Ernesto Araújo tem se posicionado contra o ataque, que, segundo ele, seria uma tentativa de impor um domínio “russo-chinês” sobre o Ocidente. O vice-presidente Hamilton Mourão também se manifestou e chegou a ser desautorizado por Bolsonaro após dizer que o Brasil é contra o ataque promovido pela Rússia.
Fonte: Agência Estado