NOVA BAHIA 2024

Crise econômica leva os brasilienses para o mercado informal

Economia ainda enfraquecida provoca alta de empregos informais. Segundo especialista, o cenário é reflexo da precarização das atividades laborais e da legislação que cortou benefícios

Ademir Rosa trabalha para ver um de seus cinco filhos com diploma – (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

“Tenho um filho de 14 anos que tem o sonho de ser veterinário. Trabalho todos os dias pensando em vê-lo com o diploma”, desabafa Ademir Rosa Ferreira, 43, que recorre ao mercado informal e hoje vende doces na Rodoviária do Plano Piloto. Ele é mais um exemplo do avanço da informalidade no DF: de acordo com a última Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), divulgada pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) em parceria com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o número de empregados sem carteira assinada — categoria de trabalhador informal — teve aumento de 1,42% entre julho e agosto deste ano.

Natural da Bahia, Ademir mora no Entorno do Distrito Federal há 12 anos. Depois de ser demitido de um emprego no aeroporto da capital do país — em que tinha a carteira assinada —, ficou cerca de três anos desempregado. Foi quando decidiu vender os doces na rodoviária. “Essa foi a única forma que encontrei de sustentar minha família”, conta.

Morando com a esposa e os cinco filhos, Ademir destaca que o comércio de doces é o único sustento da família atualmente. “Tá dando para comer e pagar o aluguel, nada mais além disso. (A conta de) água e luz atrasam sempre, mas comida não tem como deixar faltar”, frisa. “Já passei por alguns apertos para ter o que comer. Recebo doações de uma igreja, que nos ajuda com cestas básicas. Se não fosse isso, acho que veria minha família passando fome e, talvez, morando na rua”, atesta.

O vendedor de doces afirma que sente falta do emprego formal. “Até porque a carteira assinada é uma garantia de que a pessoa vai receber os seus direitos em dia e, mais na frente, fica mais fácil se aposentar. Estou com 43 anos, então, já me preocupo com essa questão”, comenta. “Além disso, o salário fixo também faz falta. Aqui, ganho se vender bem, caso contrário, com a crise atual, fica mais difícil comprar qualquer coisa.”

Para Juliana Nóbrega, consultora de carreiras e empreendedorismo e professora do Ceub, a alta na informalidade do DF está ligada à falta de uma política econômica que preveja o crescimento dos serviços e da indústria, setores que, segundo a especialista, são diretamente responsáveis pela geração de empregos (confira Três perguntas para…).

Precarização

Lúcia Garcia, coordenadora da PED do Dieese, destaca que o aumento no número de trabalhadores informais no DF está ligado também à precarização das vagas de emprego existentes. “A iniciativa privada é composta, em sua maioria, por patrões que não têm condições financeiras de garantir todos os direitos trabalhistas dos empregados”, aponta. “Existem cargos que o desconto do INSS e outros impostos — além do baixo salário — acabam pesando muito no bolso. Se o país estivesse em crescimento econômico, o trabalhador não se sujeitaria à informalidade”, frisa.

A coordenadora da PED faz uma análise da quantidade de trabalhadores informais (veja o infográfico) para ilustrar sua fala. “Entre 2015 — início de uma crise econômica — e 2022, este número cresceu 46,6%”, enumera.

“Fazendo o recorte apenas do período da pandemia, que também causou impactos na economia, percebe-se aumento: de 2020 a 2022, a elevação no mercado informal foi de 24,3%”, enumera Garcia. A especialista do Dieese afirma que, para o trabalhador do DF, está sendo um luxo pensar no amanhã. “A visão é para o hoje. Todos estão em busca de sobrevivência”, destaca.

Vendendo chinelos na Rodoviária do Plano Piloto há 10 anos, Iratânia Costa Silva, 47, reclama que acabou recorrendo ao trabalho informal por falta de oportunidade. “Quando vou para o mercado de trabalho, dizem que estou velha, mas, quando tento me aposentar, ainda não tenho idade”, comenta a moradora de São Sebastião. Ela conta que a frustração com as portas fechadas fez com que ela desistisse de tentar um emprego formal há cerca de cinco anos. “Hoje em dia, não procuro mais. O que me sobrou foi o comércio informal”, aponta.

SIEL GUINCHOS

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