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PF mira grupo de WhatsApp com comandantes de batalhões e assessor parlamentar do Exército

O coronel Gian Dermario da Silva, comandante do Centro de Instrução de Operações Especiais, é um dos mais críticos do grupo

Foto: Allan Santos / PR

O relatório da Polícia Federal sobre a análise preliminar dos celulares apreendidos do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), mostra um grupo de WhatsApp composto por oficiais superiores da ativa que oscilavam entre a resignação e pedidos de golpe contra a eleição de Lula (PT).

A Folha de S.Paulo identificou seis dos 12 militares presentes no grupo. São eles coronéis e tenentes-coronéis formados pela Aman (Academia Militar das Agulhas Negras) entre 1993 e 2000 e que, atualmente, ocupam cargos de comando e assessoria parlamentar do Exército.

O grupo é intitulado “Dosssss!!!” e possui, como imagem de perfil, um desenho de dois bonecos, um chutando o outro, com a frase em inglês “cuidado: isso é Esparta” -uma referência ao filme Os 300 de Esparta. As mensagens citadas pela PF são do período entre 27 de novembro de 2022 e 4 de janeiro de 2023.

O coronel Gian Dermario da Silva, comandante do Centro de Instrução de Operações Especiais, é um dos mais críticos do grupo.

Nas mensagens, ele diz que o Exército poderia ter atuado “há muito tempo” nas áreas de Operações Especiais, Inteligência, Contra-Inteligência e Operações Psicológicas “dentro da legalidade” para “minimizar esses impactos”. Ele comentava a notícia de que os oficiais-generais escolhidos por Lula iriam tomar posse no comando das Forças ainda em dezembro.

Na sequência, perguntado sobre o que pensava que poderia resolver a situação, Gian responde: “Uma ação por parte do PR e FA, que espero que ocorra nos próximos dias”, em referência ao então presidente Bolsonaro e as Forças Armadas.

“Sim, sem volta, ou o PR/FA fazem algo, ou serem arrastados para o problema, o que é pior”, completa.

“Guerrilha 2.0, aproximações sucessivas e indiretas. Sun Tz puríssimo do Séc XXI. Estão tomando o Poder sem disparar um tiro, com Lawfare, expressão militar do PN em segundo plano, esforço principal em manobras jurídicas e política, com Op Info moldando o psicossocial … perderam as guerrilhas rurais e urbanas no Séc passado, para se reinventarem no globalismo/progressismo socialista. Puta que o pariu, TUDO QUE ADOTAMOS E SABEMOS, mas ficamos amarrados no POLITICAMENTE CORRETO”, disse Gian.

O comandante ainda disse que dará “muita ênfase por aqui nessa disciplina do CFEsp”, numa referência ao Curso de Forças Especiais, realizado pela área que Gian é responsável.

Procurado pela Folha de S.Paulo, Gian afirmou que o grupo é “muito antigo, de mais de 10 anos de conversas e opiniões”. “Por acaso o militar está nele. Somente isso”, completou.

O coronel Marcio Nunes de Resende Junior, atualmente lotado no Estado-Maior do Exército, é um dos defensores do golpe militar contra a democracia no grupo.

“Se Bolsonaro acionar o 142, não haverá general que segura as tropas. Ou participa ou pede para sair”, disse.

A mensagem foi enviada em 21 de dezembro passado, quando generais do Alto Comando do Exército eram atacados por bolsonaristas por não apoiarem os pedidos de golpe das Forças Armadas.

A impressão que circulava entre grupos de oficiais, no entanto, era de que uma intervenção militar teria adesão dos militares com patente inferior à de general quatro estrelas.

“Se a gente não tem coragem de enfrentar o cabeça de ovo e uma fraude eleitoral, vamos enfrentar quem???” escreveu Marcio.

Já em janeiro, o coronel enviou novas mensagens no grupo de WhatsApp. Ele comentava que o nível de insatisfação dentro do Exército era tão grande que seria inviável para a Força ou o Judiciário punir todos que se manifestassem contra a posição das cúpulas militares.

‘Ainda acho que vcs estão com medo demais… Se alguém tiver lido nossas mensagens, vai preferir fingir que não leu. Primeiro que além desse grupo, existem milhares outros. Vão mandar prender ou punir todo mundo??? Na bucha eles preferem fingir que está tudo bem, que as FA não são golpistas. Nem o camarada print me preocupa. Vão fazer o quê com isso? Talvez alguns carrapatos (E olha que terá que ser carrapato para caralho, é muita gente)…. mas na prática ninguém quer mais instabilidade ainda. Imagina o AM mexendo nesse vespeiro!!! Ou imagina dentro da própria Força essa eventual caça às bruxas!!! = apagar fogo com gasolina”, disse.

Outro militar, cujo contato é salvo por Mauro Cid como “Ferreira Lima”, ponderou após as mensagens de Márcio.

“Ninguém aqui está combinando tomar o poder… são apenas opiniões. Se não se pode dar opiniões, então até os Comandos já aceitaram ser subjugados. Então fudeu…”, escreveu. “Ainda nem é possível avaliar o efeito de tudo isso na força”.

“O foda é que ficou gostosinho demais sermos só isso […] Salário garantido, guerreiro com absoluta certeza de não guerrear, uma escapada ou outra ganhando bem por aí… ficou bom demais para queríamos sair desse conforto”, reclamou.

Em outro momento, o coronel Felipe Guimarães Rodrigues, atual assessor parlamentar do Exército no Senado, disse: “Outros bravateiros…não conseguiram deter uma fraude eleitoral clara dentro do território deles !!!”.

A mensagem, no entanto, não deixa clara se a reclamação é feita contra os militares que atuaram junto ao Ministério da Defesa na fiscalização do processo eleitoral ou ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

A Defesa fez uma série de ações de auditoria e fiscalização do processo eleitoral, convidada pelo TSE, e o relatório final dos militares não identificou fraude nas eleições, diferente do que Bolsonaro afirmava à época.

Apesar de ser integrante do grupo, Mauro Cid não aparece nas trocas de mensagens reproduzidas no relatório da Polícia Federal.

Em ofício enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal), o delegado Fábio Shor afirmou que as mensagens trocadas entre os militares “incentivam […] a execução de um golpe de estado após o pleito eleitoral de 2022”.

“Os elementos de prova, ora apresentados, decorrentes da análise parcial realizada nos dispositivos apreendidos ratificam a hipótese criminal relacionado a participação dos investigados na tentativa de execução de um golpe de estado, seja por meio de induzimento e instigação de parcela da população aderente à ideologia política professada, seja por meio de atos preparatórios e executórios propriamente ditos”, concluiu o delegado da PF.

A Folha de S.Paulo procurou todos os militares membros do grupo citado pela PF no relatório. O oficial da reserva André Luiz, conhecido como Bodão, afirmou que suas únicas manifestações no grupo “foram a respeito de um antivírus”.

Os coronéis Rodrigo Lopes Bragança Silva e Marcio Nunes preferiram não se manifestar. O Exército e os demais citados não responderam.

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