Cardápios devem trazer, no máximo, 15% de ingredientes com estas origens e a promessa é chegar a 10% em 2026
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Impacto pode ser medido por números: 40 milhões de alunos de quase 150 mil escolas públicas recebem cerca de 10 bilhões de refeições por ano – Foto: :Denisse Salazar / AG. A TARDE
Além da proibição do uso do celular, o ano letivo começou com outra medida que vai causar muito impacto no ambiente escolar brasileiro: a redução de 20% para 15% no limite de utilização de alimentos processados e ultraprocessados na alimentação escolar em 2025.
E com promessas de diminuir ainda mais em 2026, ficando limitados a 10% do que os estudantes da rede pública vão ingerir no café da manhã, almoço e lanche da tarde.
Na prática, isso significa passar longe de biscoitos, sucos industrializados, achocolatados e embutidos, que carregam dentro das embalagens uma grande quantidade de sal, açúcar e gordura, além de muitos corantes e conservantes.
A novidade foi anunciada no começo do mês na 6ª edição do Encontro Nacional do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), em Brasília.
O próprio encontro voltou a acontecer após muitos anos, animando nutricionistas, educadores e todos preocupados com o impacto dos excessos da alimentação na vida das crianças e jovens.
A nutricionista Alessandra Santana Nóbrega, que integra a equipe do Pnae na rede estadual e esteve em Brasília, comemora o fato do tema ganhar mais visibilidade: “O programa de alimentação escolar tem esse papel muito importante de garantir duas ou três refeições equilibradas, que possam garantir as necessidades das crianças, tanto do ponto de vista do crescimento quanto do aprendizado”, pontua Alessandra.
O impacto pode ser medido pelos números do programa: 40 milhões de alunos de quase 150 mil escolas públicas recebem aproximadamente 10 bilhões de refeições por ano.
No ano passado, o orçamento do Pnae foi de R$ 5,3 bilhões, com pelo menos 30% dos alimentos adquiridos da agricultura familiar, que é outro foco do programa.
Processual
Segundo Alessandra, desde o início o programa já é voltado para um cardápio mais saudável, com uma boa oferta de legumes, frutas e verduras, além de produtos regionais. Mas estabelecer uma porcentagem para a redução dos processados e ultraprocessados reforça suas metas. “A redução é gradual, para as escolas se adaptarem, e os alunos também”, explica.
Um dia no cardápio escolar pode trazer no café da manhã opções como cuscuz com ovo, banana cozida, batata doce ou aipim, acompanhado de café com leite; ou vitamina de banana e maçã com aveia em flocos.
Já o almoço pode ofertar estrogonofe de frango com cenoura ralada e milho verde, arroz parboilizado e tangerina, ou ensopado de músculo com chuchu e cenoura, arroz branco, feijão carioca e laranja. O lanche da tarde segue parecido com o café da manhã.
Os cardápios são adaptados para cada região do estado, valorizando a agricultura familiar, com prioridade para assentamentos de reforma agrária, comunidades indígenas e quilombolas e grupos formais e informais de mulheres.
Atualmente, no mínimo 30% dos recursos devem ser destinados à aquisição de itens da agricultura familiar. Aqui na Bahia, Alessandra cita, por exemplo, as cooperativas Coopag e Cooperecê, que reúnem pequenos produtores.
De uma forma geral, conta Alessandra, os alunos aceitaram bem as mudanças que têm ocorrido e têm preferência pelo almoço. Com as frutas houve mais resistência, mas ela diz que é um trabalho educativo e que eles precisam entender a importância delas na alimentação. “Precisamos construir esses hábitos e mostrar os resultados lá na frente, pois os índices de crianças e adolescentes com problemas de saúde têm crescido muito”, afirma.
De acordo com o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional 2023, do Ministério da Saúde, a cada sete crianças brasileiras, uma está com excesso de peso ou obesidade.
Isso significa 14,2% das crianças com menos de cinco anos, quando a média global é de 5,6%. Entre os adolescentes, a taxa é ainda mais alta: 33%, ou um terço dos adolescentes têm excesso de peso.
Planejamento
E para a rotina em casa ou para as mães que preparam o lanche o lanche para os filhos levarem à escola, a dica para escapar das tentações empacotadas é planejamento. “É um desafio mesmo, pois não podemos separar as pessoas dos seus contextos. Uma mãe que trabalha, chega em casa exausta e só vai pensar na hora que a criança vai para a escola o que ela vai levar, acabará optando por coisas mais práticas”, reconhece a nutricionista Angelina Cordeiro, especialista em nutrição materna e infantil.
Por isso, aconselha, é preciso planejar a semana e deixar as coisas mais organizadas, para distribuir ao longo dos dias. Ela aconselha frutas da estação, que são mais baratas, sanduíche de pão com queijo ou com frango desfiado, pipoca, iogurte natural com granola, suco (de polpa ou frutas) e castanhas como boas opções. “Mas a gente precisa ter acesso fácil a estas coisas, então é preciso buscar alternativas que se adequem à rotina das famílias”, completa, acrescentando que tudo feito em casa é sempre mais indicado.
Entusiasta das novas medidas do governo para a alimentação escolar, Angelina diz que é preciso, por exemplo, encarar o abuso de açúcar nos primeiros anos de vida com mais firmeza.
E compara ao abuso do álcool e do cigarro. “Sei que é meio chocante, mas os pais precisam entender que o abuso e o acúmulo na infância vão se refletir lá na frente, sem falar na dificuldade futura de mudanças de hábitos”, pontua Angelina, mãe de dois meninos de 9 e 4 anos. “Não sou uma mãe radical e eventualmente meus filhos comem doces e outras guloseimas, mas não como uma rotina”, afirma, acrescentando que o melhor mesmo é não levar a tentação para casa. “Porque comer é prazer e quase todas as nossas celebrações acabam se voltando para a mesa”, considera.