A cepa H5N1 da gripe aviária altamente patogênica já chegou a quase todos os continentes © Getty Images
Cientistas estão soando o alarme sobre o que alertam que pode se tornar a próxima pandemia — uma doença que já circula há meses em milhares de propriedades rurais e recentemente foi identificada no Brasil.
Pesquisadores que estudam como as doenças se desenvolvem alertam que talvez nem tenhamos percebido que os EUA já ultrapassaram o ponto de virada para que a gripe aviária se torne uma pandemia humana, devido à vigilância falha.
A doença já foi identificada em aves silvestres e mamíferos nos 50 Estados americanos e deixou de estar restrita a granjas, infectando mais de mil rebanhos leiteiros, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Já houve pelo menos 70 infecções humanas e uma morte.
No Brasil, o patógeno apareceu entre aves comerciais pela primeira vez na semana passada. O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) confirmou a detecção do vírus da gripe aviária em uma granja comercial em 16 de maio.
O surto foi identificado num estabelecimento que produz ovos férteis para produção de frango no Rio Grande do Sul. Anteriormente, o vírus havia sido encontrado apenas em aves silvestres migratórias e em aves de subsistência.
detecção teve um impacto imediato nas exportações de frango brasileiras. A China, União Europeia e Argentina suspenderam as importações do produto.
Oportunidades cruciais para conter a disseminação foram perdidas tanto pelo governo do ex-presidente Donald Trump quanto pela gestão de Joe Biden, segundo a epidemiologista Caitlin Rivers, professora associada da Escola de Saúde Pública Bloomberg da Universidade Johns Hopkins.
Por exemplo, diferentes estados adotaram regras distintas sobre o transporte de animais entre fronteiras estaduais.
“[A gripe aviária] não é um problema temporário — houve uma percepção equivocada de que ela sumiria. Agora há uma consciência de que é um problema que precisa ser administrado”, diz ela.
“A grande prioridade agora é a detecção. Encontrar casos em humanos para ver como o vírus está mudando — esse é o maior risco.”
A gripe aviária será a próxima pandemia?
Epidemiologistas estão muito preocupados com o fato de que o mundo — não só os EUA — talvez não esteja suficientemente preparado.
“Se dermos espaço para que o vírus continue evoluindo e se adaptando à infecção de outros mamíferos, a preocupação é se o surto atual entre animais nos EUA é, na verdade, o gatilho para outra pandemia”, diz Kamran Khan, professor de medicina da Universidade de Toronto.
“Sabemos historicamente que o H5N1 é um vírus muito perigoso para humanos”, acrescenta.
Desde novembro de 2003, mais de 700 infecções humanas pelo vírus H5N1 foram notificadas à Organização Mundial da Saúde (OMS), principalmente em 15 países. Indonésia, Vietnã e Egito concentram o maior número de casos.
Portanto, a gripe aviária não é uma novidade. O que preocupa agora os cientistas são três fatores principais: primeiro, o número elevado de espécies de mamíferos infectadas (pelo menos 70, segundo a ONU), em fazendas, áreas silvestres e até entre animais de estimação.
Por fim, a instabilidade na saúde pública provocada pelo novo governo Trump: especialistas em doenças infecciosas foram demitidos de várias agências federais, interrompendo o programa de testagem da gripe aviária, e o aumento da fiscalização sobre trabalhadores rurais estrangeiros faz com que muitos tenham medo de fazer testes, temendo deportação.