Em 2001, a sífilis congênita acometia um em cada mil bebês nascidos vivos no Brasil. Em 2015 esse número saltou para 6,5 em mil no Brasil e 12,4 em mil no Rio de Janeiro, o estado mais afetado. A meta da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e do Unicef previa uma redução para 0,5% caso por nascido vivo em 2015.
— Vimos acontecer exatamente o contrário. A sífilis teve um aumento significativo — afirma o pediatra Gil Simões, diretor do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj), que há quatro décadas atende crianças em hospitais da rede pública e fez um levantamento dos casos baseado nos números do Ministério da Saúde.
Em nota, o Ministério da Saúde diz que “diversos fatores podem contribuir para o aumento dos casos notificados de sífilis registrado nos últimos anos, entre eles a melhoria da vigilância e do diagnóstico”. Gil Simões diz que o aumento dos casos é observável em maternidades e serviços pediátricos.
— Sem dúvida, a vigilância e o diagnóstico melhoraram. Mas isso só não explica o que vemos nos hospitais. Os casos de sífilis eram raros. Agora são frequentes — salienta.
Ele explica que a sífilis traz um problema complexo.
— Não há uma causa só, mas um conjunto de fatores — salienta Simões.
O principal é a falta de assistência médica de qualidade, principalmente no pré-natal.
— Há ainda um abismo de classes. Os mais pobres são os mais atingidos porque, muitas vezes, não têm acesso a um pré-natal bem feito. E isso não tem a ver apenas com o número de consultas. Ainda faltam capacitação e atualização dos profissionais de saúde no manejo das DSTs — diz Simões.
Os dados oficiais mais recentes, do Boletim Epidemiológico de 2016 do Ministério da Saúde, indicam que, entre 2014 e 2015, a sífilis adquirida teve um aumento de 32,7%, a sífilis em gestantes de 20,9%, e a congênita de 19%. Em 2015, o número total de casos notificados de sífilis adquirida no Brasil foi de 65.878, sendo os homens 60,1% deles.
O ministério lançou em outubro passado uma ação nacional de combate à sífilis junto aos profissionais de saúde. A meta é melhorar a qualidade do pré-natal e do diagnóstico e a precisão das notificações, que são obrigatórias.
Mesmo assim, faltam informação e atendimento básico de qualidade, destaca Carolina Batista, diretora médica para a América Latina da iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi, na sigla em inglês), uma organização criada pelos Médicos Sem Fronteiras (MSF), entre outras entidades.
— Cada criança com sífilis congênita carrega o peso de variados distúrbios e o estigma de uma doença que não precisaria mais ser motivo de preocupação. Falamos de uma doença para a qual a medicina já encontrou a solução. Mas a sociedade ainda não — frisa Carolina.