A produção de cacau em sistemas agroflorestais (SAFs) gera, no mínimo, seis vezes mais renda que a criação de gado por hectare na região amazônica. Além disso, os cacauicultores tendem a ocupar áreas menores e a conservar mais florestas. É o que conclui o engenheiro florestal Daniel Braga, que participa como pesquisador do programa de Pós-Graduação em Recursos Florestais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), vinculada à Universidade de São Paulo (USP), .
Os resultados comparativos mostram que a produção de cacau em SAF proporciona uma renda entre 580 e 1.020 dólares, ocupando apenas 14 a 15 hectares de terra. Já a criação de gado sob o sistema de pecuária extensiva precisa ocupar entre 55 e 63 hectares para gerar ganhos de 110 a 142 dólares.
O trabalho da Esalq/USP reforça a relevância de realizar pesquisas sobre a região, principalmente hoje, 5 de setembro, quando é comemorado o Dia da Amazônia. Ele visa à conscientização de toda a sociedade a respeito dessa importante riqueza natural e como a produção agroflorestal pode ser uma prática economicamente viável para a preservação do maior bioma brasileiro.
“O cacau é mais rentável do que o gado, considerando a área ocupada, em hectare. O que acontece é que as famílias normalmente conseguem manter entre 10 e 15 ha de cacau (produtividade média de 630 kg de amêndoa por ha), depois disso a mão de obra fica muito elevada e necessitam contratar. Já o gado, produzido no sistema de cria, pela agricultura familiar, normalmente vai ter entre 40 e 70 ha de pasto em pecuária extensiva com baixa produtividade (1,5 cabeças por ha)”, explica Braga.
Desmatamento
O pesquisador conta que, para que esse modelo de pecuária seja rentável, são necessárias grandes áreas de pastagem, o que acaba estimulando o produtor a aumentar o tamanho da sua propriedade e provocando mais desmatamento.
“Quando as famílias adotaram cacau e gado na mesma propriedade a chance de sucesso aumentou, porém, ao custo de maior desmatamento pela pecuária extensiva. Entendendo a complementariedade econômica entre ambos sistemas produtivos, a intensificação da pecuária em áreas menores é fundamental”, afirma o engenheiro florestal.
Segundo o especialista, após quase meio século de ocupação da Transamazônica, ainda há problemas graves de infraestrutura, educação, saneamento básico, criminalidade, disputa pela terra, entre outros.
“A preocupação com os problemas decorrentes da pobreza e desmatamento ilegal, diante do mercado do cacau em ascensão mundial, tem chamado cada vez mais a atenção para os sistemas agroflorestais com cacau, como potencial ferramenta de reabilitação de áreas degradadas/alteradas, capaz de conciliar a produção com a conservação florestal”, comenta.
Alternativa à pecuária
O sistema agroflorestal com cacau, em condições favoráveis de solo, pode ser uma alternativa à pecuária extensiva. De acordo com o engenheiro florestal, além desse fruto, os SAFs diversificam a renda familiar e, no melhor dos casos, podem incluir o uso de plantas nativas, adaptadas à menor fertilidade.
“Para difundir tais sistemas produtivos mais complexos, é necessário reforçar políticas direcionadas às condições e populações locais, com suporte à agricultura familiar. Além disto, é fundamental consolidar mercados atrativos para uma diversa gama de produtos nativos, como castanha-do-brasil, açaí, babaçu, cajá, cupuaçu, bacaba, buriti e muitos outros. Portanto, é urgente estabelecer novas estratégias de desenvolvimento sustentável para Amazônia”, alerta Braga.
De acordo com ele, o mercado dessas espécies alternativas, muitas vezes, não estão bem consolidados e precisam ser fomentados. Para tanto, seria necessária a adoção de melhores políticas públicas – com articulação multilateral entre instituições, inclusive os bancos –, que estimulem o aproveitamento da biodiversidade a partir de cadeias de valor específicas. Somente assim, diz o pesquisador, o produtor sentiria segurança de investir mais nessas espécies.
Indicador de sucesso
O estudo da Esalq/USP realizou 95 entrevistas ao longo de sete municípios do Estado do Pará (Uruará, Medicilândia, Brasil Novo, Anapu, Pacajá, Novo Repartimento e São Félix do Xingu). A partir desses dados, o pesquisador desenvolveu um indicador de sucesso baseado na renda e moradia familiar.
“Sobre o sucesso das famílias, é importante ressaltar que esse é um indicador calculado a partir da junção dos fatores de renda e moradia, que são indicadores de bem-estar econômico. O grande resultado da pesquisa é mostrar que o produtor de cacau, em sistema agroflorestal, tem a mesma chance de ser bem sucedido assim como o pecuarista, com o diferencial de que ele ocupa áreas menores e tende a conservar mais os recursos florestais”, afirma Braga.
Conforme o engenheiro florestal, até então, na percepção do senso comum, costumava-se pensar que apenas a pecuária poderia levar o produtor a ser bem-sucedido. “Por essa razão, ser fazendeiro traria certo status social. Mas o cacauicultor também pode alcançar este status, também pode ter boa moradia, ganhar bem, ter uma caminhonete, colocar os filhos para estudar e viver bem”, salienta.
Fonte: Esalq/USP