Guerra se arrasta sem perspectiva de fim, com pesadas baixas e desgaste para ambos os países
A fadiga nas duas frentes de batalha e no campo da diplomacia reflete o atoleiro em que a guerra russa na Ucrânia mergulhou, ao adentrar o seu terceiro ano sem perspectiva para acabar.
O país comandado por Volodymyr Zelensky resiste como pode: falta munição, a ajuda de US$ 60 bilhões está empacada no Congresso americano, outra guerra, a de Israel em Gaza, monopoliza as atenções da opinião pública internacional, e o cotidiano brutal dos confrontos já não mobiliza o Ocidente como no início da invasão russa, há dois anos.
Os próximos 12 meses serão determinantes no futuro da guerra. Tanto Putin como o presidente americano, Joe Biden, de quem Zelensky depende financeiramente, buscam a reeleição. As urnas russas não trarão surpresas, mas as dos EUA podem mudar o rumo do apoio americano à Ucrânia.
A perspectiva de Donald Trump retornar à Casa Branca equivale ao pior pesadelo de Zelensky. Com a habitual retórica virulenta anti-Otan, o ex-presidente já avisou que, caso seja eleito, fechará as torneiras para a Ucrânia e pressiona os republicanos da Câmara a fazerem o mesmo, retardando a aprovação do pacote de ajuda ao país.
Tragédia humanitária
Enquanto a guerra se arrasta, a tragédia humanitária se cristaliza. Embora não haja estatísticas fiéis, estima-se que pelo menos 500 mil pessoas morreram nos dois lados das trincheiras. O conflito expulsou de suas casas mais de 14 milhões de ucranianos — um terço da população — e mandou 6,5 milhões de refugiados para países vizinhos, de acordo com dados da Organização Internacional para as Migrações.
Nesse terceiro ano, a ajuda dos EUA e da União Europeia se faz mais vital para a Ucrânia. As contas aumentam na mesma medida do cansaço de combatentes e doadores. Na semana passada, suas tropas foram obrigadas a retirar-se de Avdiivka, em Donetsk, sofrendo a maior derrota para a Rússia desde maio, após pesados bombardeios que infligiram grande número de baixas para ambos os lados.
Passando o chapéu
Zelensky fez um périplo por dezenas de países, no último ano, passando o chapéu e implorando por ajuda financeira. Em nome da segurança europeia, os EUA e a União Europeia tentam evitar a vitória de Putin na maior guerra no continente desde 1945.
Apesar de isolado e com mandado de captura expedido pelo Tribunal Penal Internacional, o presidente russo demonstrou-se eficaz ao conseguir driblar as duras sanções. Buscou alternativas, abrindo espaços para a venda de gás e petróleo, e ampliou sua influência na África, na Ásia e na América do Sul.
Ação e reação
Se, no início da invasão, Putin achava que sua ofensiva militar se resolveria em poucos dias, foi surpreendido pela reação da Ucrânia, com o respaldo da Otan, liderada pelo governo Biden. Dois anos depois, a unidade entre os membros da aliança atlântica começa a se esgarçar e a contraofensiva ucraniana não conseguiu desalojar os russos do Leste.
A maré mudou, e a Rússia ganhou ímpeto, conforme observou o general reformado David Petraeus, ex-diretor da CIA e ex-comandante das tropas americanas no Afeganistão e no Iraque, em entrevista ao analista de segurança da CNN, Peter Berger:
“Os russos certamente aprenderam certas lições depois de aparentemente não terem sido capazes de fazer isso durante o primeiro ano de guerra. A Rússia pôs a sua economia em função de guerra total, e é aqui que a realidade entra em cena, já que o país tem o triplo da população da Ucrânia e sua economia é 10 vezes maior”, resumiu Petraeus.