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Cardiologista apoia interiorização da medicina na Bahia

Segundo José Carlos Brito, o SUS ainda tem muito a evoluir, mesmo com os avanços que já conquistou

Nesta quarta-feira (18), é celebrado o Dia do Médico. Profissão milenar que passa por transformações constantes – e cada vez mais dinâmicas –, a área médica também é foco de debates constantes no Brasil, devido aos muitos desafios da saúde pública, da alta concorrência por vagas na graduação em medicina, e do surgimento de programas governamentais e novas faculdades.

Na data que em que o médico é protagonista, se faz necessário a reflexão sobre os avanços e obstáculos que a profissão – e, a área de saúde, como um todo – precisam encarar.

Entre os desafios, o foco da atenção é mesmo o Sistema Único de Saúde (SUS) que, concedido inicialmente como uma conquista para grande parte da população brasileira, encontra dificuldades para oferecer o atendimento ideal aos que deles dependem.

Para o cardiologista, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia – seccional Bahia e do Clube dos Médicos da Bahia, além de ex-secretário de Saúde de Salvador entre 2008 e 2010, José Carlos Brito, o SUS ainda tem muito a evoluir, mesmo com os avanços que já conquistou.

O médico – que atualmente é coordenador do setor de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista do Hospital Santa Izabel – alerta que, ainda que haja recursos para a saúde pública, estes continuam sendo mal geridos.

“É preciso melhorar, principalmente no que diz respeito ao financiamento. A saúde no Brasil é subfinanciada. A saúde pública no Brasil gasta R$ 30 por mês por cada brasileiro. Isso corresponde a R$ 3,30 per capita por dia. Isso é um dos menores investimentos da América Latina”, avaliou o médico, que também já foi presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia – seccional Bahia.

As entidades médicas tem se preocupado cada vez mais com a atenção básica, que é o cuidado inicial prestado nas Unidades de Saúde da Família, e que é o pilar de sustentação para a saúde pública. “São nessas unidades que você faz o controle da hipertensão, da diabetes, da prevenção de doenças cardiovasculares, e outras doenças, orienta como os pacientes devem se portar em determinadas situações”, exemplificou.

É preciso, segundo o médico, resultados melhores no controle de doenças, e tornar a atenção básica, de fato, resolutiva, a fim de evitar evolução dessas doenças – que, por sua vez, levarão a mais gastos públicos com o paciente.

“Quando você tem uma atenção básica forte, se tem menos internações hospitalares, menos necessidades de terapia intensiva. Se você não trata bem um portador de diabetes, ele será candidato a hemodiálise, e seguramente, terá problemas vasculares, que levarão a amputações, além de problemas cardiovasculares”, alertou Brito.

Na Bahia, um problema que perdura por décadas, é a centralização do atendimento, sendo muito comum, a necessidade de ida de pacientes do interior aos grandes centros urbanos para diagnosticar corretamente o seu problema de saúde.

“Há a necessidade descentralização dos atendimentos de alta complexidade. Então a construção de hospitais fora da capital, ao exemplo da Chapada Diamantina, são extremamente positivos. Eles vêm preencher vazios assistenciais na alta complexidade”, explica o médico.

Somados aos hospitais regionais, outra proposta bem avaliada pelo cardiologista, no sentido, de descentralizar o atendimento e desafogar as unidades na capital, são as multiclínicas, que são resultado do esforço dos municípios que se juntam para fazer o custeio da unidade. Falta, no entanto, uma resposta mais efetiva a esse esforço, tanto quanto os hospitais regionais, conforme avalia Brito.

De acordo com o Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb), o estado tem, hoje, 22.055 médicos em situação regular para atuação. Destes, 12.285 estão em Salvador e 9.770 no interior do estado.

Formação profissional

Outro debate que permeia os profissionais e entidades médicas está justamente atrelada a qualidade do médico que está chegando às unidades de saúde daqui pra frente. O Brasil tem caminhado para ser o líder entre países com maior número de faculdades de medicina no mundo, já tendo superado Estados Unidos e China, e, atualmente, perdendo apenas para a Índia.

A Bahia, até o início dos anos 2000, possuía apenas duas faculdades de medicina, sendo uma pública (Universidade Federal da Bahia), e a outra particular (Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública). Nos últimos quinze anos, no entanto, várias outras vem surgindo.

Segundo o Ministério da Educação (MEC), há 18 instituições oferecendo o curso de medicina no estado atualmente, sendo que, deste grupo, 10 ainda não formaram a primeira turma. Juntas, todas elas estão autorizadas a oferecer 1.643 vagas por ano.

A preocupação, segundo Brito, é justamente com a qualidade da formação que os cursos precisam ter, e, de uma série de dúvidas que surgem a partir daí, a começar pelo corpo docente, o campo de prática, em que hospitais os estudantes estarão inseridos, entre outras.

“Médico mal formado é pior coisa que pode acontecer para uma sociedade”, alertou o cardiologista.

Anualmente, o Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb) realiza cerca de 922 registros de primeira inscrição (médicos recém-formados). Em 2016, foram 697 registros de primeira inscrição.

Interiorização

A mesma preocupação sobre que atendimento teria a população agora veio com o início do Programa Mais Médicos, do Governo Federal, que trouxe 13 mil médicos formados fora do país – a grande maioria veio de Cuba – para atuar nas regiões onde haveria maior carência desse atendimento.

Contudo, após quatro anos de programa, a avaliação é de que o programa chamou a atenção para a saúde pública do Brasil, trazendo benefícios para atenção básica, mas também ressalvas.

“Os países são diferentes, a epidemiologia das doenças são diferentes. Então foi muito criticada a maneira como o Brasil trouxe esses médicos, pois havia um diálogo permanente entre as entidades médicas e o Ministério da Saúde, e aquilo foi atropelado por uma decisão política”, explicou Brito.

Atualmente, já está havendo uma substituição dos médicos cubanos pelos médicos formados no Brasil, principalmente para as regiões mais inóspitas, em que antes não havia o interesse dos profissionais brasileiros.

O fator que talvez explique esse interesse pode ser o aumento das faculdades de medicina. Entretanto, a preferência dos médicos pós-graduados continua sendo pelos grandes centros urbanos, ou pelo menos, para as cidades que possam lhes dar uma melhor qualidade de vida, em termo de infraestrutura para morar. Por esta mesma razão, continua sendo um desafio ter especialistas nas cidades menores.

“É bom destacar que esta não é uma realidade brasileira, apenas. Isso acontece também em lugares desenvolvidos como o Reino Unido e o Canadá, onde há certo vazio assistencial nas pequenas cidades, porém, nestes países, a saúde chega até essas pessoas”, observou o cardiologista.

Data

Em vários países do mundo, o Dia do Médico é celebrado em 18 de outubro, por ser também o dia de celebração à São Lucas, nos países com mais praticantes das religiões cristãs. O médico teria sido também um dos poucos cristãos que chegou a conviver com os doze apóstolos de Jesus Cristo.

Ainda que haja poucos registros históricos precisos sobre o nascimento ou mesmo a morte do santo, acredita-se que Lucas teria estudado medicina na antiga cidade de Antioquia, que, hoje corresponde a uma área pertencente à Síria.

Além de escrituras antigas onde o cristão usa de termos e palavras que seriam de interesse médico, outra evidência do sua ocupação veio da “Epístola dos Colossenses”, na qual São Paulo refere-se ao amigo como “Lucas, o amado médico”.

Por esta, o santo é hoje considerado padroeiro desses profissionais de saúde, assim como dos curandeiros, genealogistas e pintores.

 

Por Matheus Fortes  Tribuna da Bahia

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