Milhares de argentinos viraram a noite na praça em frente ao Congresso, para acompanhar a votação, na Câmara dos Deputados, do projeto de lei que legaliza o aborto. Todos estavam preparados para enfrentar o frio de 5 graus: fizeram fogueiras, montaram barracas e dançaram, ao som de tambores, pedindo aos legisladores o direito a um “aborto livre, gratuito e seguro”.
A sessão começou nessa quarta-feira (13) e, até o fim da noite, havia um empate entre os deputados que discursaram a favor e contra a legalização do aborto. Do lado de fora do Congresso, ativistas dos dois lados ocuparam a praça e defendiam sua posição.
Em um canto da praça, um grupo erguia bandeiras argentinas para mostrar que defendiam a vida – tanto da mãe quanto do feto. “A legalização do aborto viola os direitos humanos da criança que está por nascer”, disse a estudante universitária Simone Beltrami. Segundo ela, o governo deveria investir em educação sexual, em programas sociais de apoio às grávidas e em leis que facilitem o processo de adoção, em vez de legalizar o aborto.
Do outro lado da praça, uma multidão maior acenava com lenços verdes – o símbolo da campanha pela legalização do aborto.Uma das manifestantes, a médica Amparo Lopez, diz que o aborto – apesar de ilegal – sempre foi e sempre será praticado. “Ao legalizá-lo evitaremos muitas mortes”, argumentou. “As mulheres que não querem ou não podem ter filhos poderão interromper a gravidez num hospital, em vez de recorrer a curandeiros ou clínicas clandestinas”.
Segundo as estimativas, 500 mil abortos clandestinos são feitos todos os anos na Argentina. Cerca de 60 mil resultam em complicações e hospitalizações. E muitas mulheres – a maioria pobres ou do interior – morrem por causa de abortos mal feitos. Atualmente, a legislação argentina só permite o aborto em casos de estupro ou se a vida e a saúde da mãe correrem risco.
Desde 2007, sete projetos de lei legalizando o aborto foram apresentados. Este é o primeiro que foi votado. Se for aprovado, as mulheres terão o direito a abortar livremente até completar 14 semanas de gestação. Depois disso, somente em casos de estupro, se a vida e saúde da mãe estiverem em risco ou se o feto sofrer uma malformação incompatível com a vida fora do útero. Independentemente do resultado, o projeto abriu um debate que, segundo o presidente Mauricio Macri, foi “postergado durante 35 anos”. Apesar de apoiar uma discussão “madura” sobre um assunto polêmico, Macri é pessoalmente contra o aborto. Os antecessores dele também.