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Como a decisão de manter a Selic alta impacta as pessoas, empresas e o governo

Pressão de Lula, centrais sindicais e setores empresariais não surtiu efeito, e Banco Central manteve taxa básica de juros no patamar mais alto desde janeiro de 2017, citando necessidade de reduzir inflação.

Selic alta influencia a taxa dos financiamentos a consumidores, encarecendo a compra de bens em prestações, como veículos© Pedro Vilela/Getty Images

A pressão política exercida nas últimas semanas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e por centrais sindicais e setores empresariais sobre o Banco Central não surtiu o efeito desejado. Na quarta-feira (22/03), o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a taxa básica de juros, a Selic, em 13,75% ao ano – a maior desde janeiro de 2017.

Foi a segunda decisão do Copom sobre a Selic desde o início do governo Lula, que vem feito defesas enfáticas da redução da taxa. Para o presidente, isso seria importante para estimular o consumo e novos investimentos. Para o Banco Central, porém, cortar a taxa agora colocaria em risco a redução da inflação.

Havia expectativa de operadores de mercado que o Copom ao menos sinalizaria o viés de reduzir os juros na próxima reunião, no início de maio, mas isso não ocorreu.

O principal objetivo da política de juros do Banco Central é controlar a inflação. Desde maio de 2021, a instituição tem autonomia em relação ao governo, o que significa que Lula não pode demitir seu presidente ou diretores, que têm mandatos de quatros anos.

Efeitos da Selic alta

Investimento: Um dos resultados da manutenção da taxa Selic no atual patamar é o desestímulo para que empresas usem suas reservas financeiras ou peguem dinheiro emprestado para investir em novos projetos ou expansões.

Em um ranking de 40 países, o Brasil é o que tem hoje a mais alta taxa de juros real (descontada a inflação), de 7,38%, segundo levantamento do site MoneYou.

Para uma empresa ou investidor com dinheiro em caixa, mantê-lo rendendo no banco pode ser mais vantajoso do que arriscar investi-lo em um negócio que pode ou não vir a dar lucros superiores a esse retorno garantido. Mas, sem investimento, fica mais difícil para o país crescer e produzir mais riqueza.

Consumo: Outro resultado de uma Selic alta é o desestímulo à compra de bens e produtos financiados. A taxa básica de juros influi nas taxas cobradas pelos bancos dos consumidores.

Com taxas mais altas, fica mais caro comprar uma moto ou uma geladeira a prestações, por exemplo, desestimulando as pessoas a fazerem isso.

A demanda por produtos cai, o que força as empresas a diminuir ou a não aumentar os preços, reduzindo assim a pressão sobre a inflação.

Empregos: A restrição ao consumo, por sua vez, influencia negativamente no faturamento das empresas, desestimulando novas contratações – e as que estão em pior situação podem ser forçadas a demitir.

Esse é um dos motivos que leva as centrais sindicais a também se juntarem na pressão sobre o Copom. Apesar das altas taxas de juros, porém, o Brasil vem registrando uma trajetória de melhora do mercado de trabalho nos últimos 12 meses, devido à recuperação pós-pandemia.

Gasto com dívida: A taxa Selic é usada como parâmetro para corrigir 38% dos títulos da dívida pública federal – os empréstimos feitos pelo governo federal para captar recursos no mercado.

Quanto maior a Selic, maior o gasto do governo com juros da dívida pública. Se a taxa for mantida no atual patamar até o final do ano, os gastos com juros dessa dívida podem chegar a R$ 813 bilhões no ano, segundo uma projeção feita pela empresa financeira XP à emissora CNN Brasil.

Se a Selic começasse a cair no meio de ano e chegasse a 10% em dezembro, haveira uma economia de cerca de R$ 113 bilhões em gastos com juros, segundo essa estimativa.

Cenário da inflação

A inflação vem caindo desde abril de 2022, quando atingiu um pico de 12,13% ao ano, devido à crise nos preços da energia provocada pela guerra na Ucrânia e a efeitos da pandemia nas cadeias produtivas.

Em fevereiro, a inflação medida pelo IPCA em doze meses foi de 5,6% – ainda fora da meta para este ano, de 1,75% a 4,75%.

Mas a expectativa dos operadores do mercado para a inflação deste ano aumentou desde a última reunião do Copom, o que foi citado como uma das justificativas para a decisão de manter a atual taxa Selic.

Espera por nova regra fiscal

Outro ponto que foi citado pelo Copom são as incertezas sobre que medidas o governo Lula adotará para buscar o equilíbrio das contas públicas.

O Congresso aprovou em dezembro de 2022 uma emenda à Constituição que abre espaço para o fim do teto dos gastos, e deu ao presidente da República até agosto deste ano para apresentar um modelo fiscal alternativo.

O governo ainda está discutindo seu novo modelo de arcabouço fiscal. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresentou a Lula uma proposta, mas a decisão ficou para abril.

A falta de clareza sobre qual será esse novo arcabouço fiscal faz com que operadores de mercado fiquem incertos sobre o equilíbrio entre gastos e despesas do governo.

Se houver dúvida sobre a capacidade de o governo pagar suas dívidas, diminui a disposição de emprestar dinheiro ao governo, o que força o aumento das taxas de juros.

EUA e Europa aumentaram juros

A decisão do Copom de manter a Selic no mesmo patamar foi tomada no mesmo dia em que o Fed, o Banco Central dos Estados Unidos, aumentou a taxa de juros básica do país em 0,25 ponto percentual, de 4,75% para 5%, também motivado por preocupações relativas à inflação.

Na semana passada, o Banco Central Europeu também decidiu aumentar a taxa de juros básica da zona do euro em 0,5 ponto percentual, para 3,5%. Como justificativa, a necessidade de reduzir a inflação.

Se a inflação em outros países diminuir nos próximos meses, isso poderia contribuir para também reduzir a inflação no Brasil e abrir espaço para mais quedas da Selic.

bl/ek (ots)

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