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Brasil tem um prefeito cassado por semana

Cerca de 14 mil eleitores de Fundão, na região metropolitana de Vitória, no Espírito Santo, vão escolher hoje o seu novo prefeito. A 1,5 mil quilômetros dali, os dez mil moradores da pequena Petrolina de Goiás, pertinho da capital Goiânia, também conhecerão o seu novo governante. Ambas se somam aos 43 municípios que, desde as eleições de 2016, tiveram que retornar às urnas porque os vencedores do pleito anterior tiveram seus registros de candidatura ou diplomas anulados pela Justiça Eleitoral. Há ainda quatro cidades que se preparam para realizar novas eleições nos próximos meses. Na ponta do lápis, a conta é de um prefeito cassado por semana no Brasil por problemas como ficha limpa, abuso de poder econômico e político, compra de voto e propaganda eleitoral irregular.

A tendência é que essa estatística siga em curva ascendente nos próximos meses graças a uma espécie de terceiro turno eleitoral nos tribunais. Um levantamento feito pelo GLOBO, com dados fornecidos por Tribunais Regionais Eleitorais (TRE) de 26 estados, mostra que há mais de 300 cidades sendo governadas em meio a uma guerra no Judiciário.

De um lado, estão prefeitos que respondem a processos e já foram cassados em primeira instância, mas se mantêm no cargo à custa de recursos nos TREs e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em tentativa de adiar a decisão final e, assim, conseguir esticar o mandato. Do outro, adversários derrotados, que não dão a batalha como perdida, e seguem brigando por uma nova eleição para tentar reverter o resultado anterior.

— Se tivéssemos uma Justiça mais célere e racional, e políticos menos apegados ao poder, teríamos muito menos casos como esses — diz Humberto Dantas, cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O número de cidades que vivem sob a instabilidade política e administrativa pode ser ainda maior, uma vez que os dados fornecidos pelos tribunais correspondem apenas às ações que já chegaram à segunda instância. Outros processos ainda tramitam, sem decisão, em suas varas de origem. Em muitos municípios, as eleições são questionadas em mais de uma ação. O Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro divulgou apenas três cidades que já tiveram seus prefeitos cassados pelo órgão (Duque de Caxias, Búzios e Paraty). O TRE do Piauí não divulgou dados.

De todos os estados, São Paulo é o que tem o maior número de chances de ter novas eleições. Mais de 10% dos 645 municípios estão com eleições questionadas na Justiça. Ao todo, 74 prefeitos — muitos respondendo a mais de um processo. O próprio tribunal faz monitoramento de risco de cassação, em que classifica cidades com maiores chances de passar por uma nova votação.

O município de Araras, com 130 mil habitantes, lidera esse ranking. O prefeito Pedrinho Eliseu (PSDB) obteve 42% dos votos, mesmo com seu registro de candidatura negado pela Justiça Eleitoral. Com um parecer do ministro Gilmar Mendes no TSE, que argumentou que seria melhorar esperar a decisão final antes de uma nova eleição, o prefeito conseguiu tomar posse em 1º de janeiro. O político enfrenta problemas na Justiça desde 2008, quando foi eleito prefeito, mas teve o mandato cassado sete meses depois por propaganda ilegal.

Em 2012, ele voltou a tentar as urnas, mas teve o registro de candidatura indeferido, graças à ação do Ministério Público Estadual que estendeu o prazo da inelegibilidade do político com base nas diretrizes da Ficha Limpa. Procurado, o prefeito afirmou que só se pronunciará após a decisão final.

Sem os votos de Pedrinho Eliseu contabilizado, o engenheiro Paulo Henrique Nascimento (PSD) apareceu nos registros do TRE-SP como eleito com 20%. Apesar disso, não comemorou.

— Sei como são nossa justiça e nossa política. Se tiver uma nova eleição, eu ainda não parei para pensar se vou me candidatar novamente. Das outras vezes, ele foi cassado, mas acho que agora vai insistir até o fim e conseguir se manter — diz Paulo Henrique.

Mesmo nas cidades em que a Justiça já determina uma nova eleição, os prefeitos cassados não desistem facilmente do poder e dão início a uma confusa trama judicial.

Em Petrolina de Goiás, por exemplo, Dalton Vieira dos Santos (PP), que teve o registro de candidatura indeferido e motivou a nova eleição, voltou a se candidatar no pleito suplementar, novamente com a ajuda de um recurso judicial. Se vencer neste novo pleito, a defesa de Dalton adianta que vai usar de todas as manobras para que ele permaneça no cargo.

— É uma situação que até pode causar uma insegurança na administração pública, mas são brechas da própria lei. Dalton não cometeu um ato ilícito. Ele pode concorrer — diz o advogado João Batista Fagundes Filho.

Cassado lança mulher na eleição

Em Fundão, no Espírito Santo, o prefeito cassado Anderson Pedroni (PSD) “desistiu” dos recursos, mas colocou na nova disputa Pretinho Nunes (PDT), seu vice na eleição original. Com o novo arranjo político, Alexsandra Pedroni, mulher de Anderson, se tornou companheira de chapa de Pretinho, no pleito deste domingo.

As pendências de Pedroni com a Justiça também se arrastam desde 2008. Naquele ano, foi eleito presidente da Câmara e, com a cassação do então prefeito, passou a governar o município, mas não teve as contas aprovadas.

— O Pretinho deve ganhar com 90% dos votos. O Anderson é um ótimo cabo eleitoral, mas não será ele que vai governar. Foi apenas uma costura política — diz o advogado Felipe Osório.

Diretor do Movimento de Combate è Corrupção Eleitoral (MCC), o advogado Luciano Santos atribui o “tapetão eleitoral” à morosidade da Justiça em julgar até mesmo os indeferimentos de registros de candidatura.

— A Justiça é rápida no processo eleitoral, mas demorada para julgar os recursos do mandato. Enquanto isso, maus políticos seguem administrando as cidades.

 

Fonte: JusBrasil

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