Com plantios iniciados, cultivos em andamento, máquinas em campo e próximas safras já projetadas, a agropecuária segue um calendário próprio. O ano agrícola começou faz tempo em muitas áreas rurais da Bahia. Os agricultores estão no meio da safra de soja no Oeste, colhendo uvas no norte do estado, e regando outras frutas em vários municípios do Baixo Sul.
Entre safras e entressafras, o jornal CORREIO traz um painel dos frutos gerados pelo campo em 2018, e destaca as expectativas de alguns segmentos para 2019. As principais estimativas indicam que este ano será um ano promissor para a maioria dos setores agrícolas, caso não haja grandes variações climáticas inesperadas. O cenário internacional e a valorização das commodities trazem uma tendência de vantagem para os produtores brasileiros.
Cana de açúcar
Em Juazeiro, a Agrovale – uma das maiores produtoras de açúcar, etanol e bioeletricidade do Brasil – pretende aumentar a produção em aproximadamente 20% em 2019. A empresa está investindo na modernização das operações agrícolas para chegar a uma produtividade média de 120 toneladas de cana por hectare, cerca de 5% a mais do que o patamar obtido este ano.
“A Agrovale vem investindo cada dia mais em pessoas e tecnologias. Isso nos garante a segurança para que em 2019 possamos aumentar nossa produtividade, seja na geração de açúcar, etanol ou bioeletricidade, de maneira sustentável, sólida e atenta às responsabilidades social e econômica da região em que está inserida”, pontua o diretor e vice-presidente da Agrovale, Denisson Flores.
A empresa gera 5 mil empregos. Este ano, foram moídos 1,7 milhão de toneladas de cana em área irrigada, produzidos cerca de 2,4 milhões de sacos de açúcar, e 64 milhões de litros de etanol. Nos campos do norte da Bahia foram gerados ainda 20 mil megawatts de energia a partir do bagaço de cana.
Cerca de 90% dos produtos que saem dos canaviais são consumidos na Bahia, os outros 10% são direcionados para outros estados do Nordeste.
Florestas plantadas
Segundo os principais indicadores, a demanda global por celulose também continuará crescente. Por conta disso, o Brasil deve ampliar a produção e o plantio de florestas nos próximos anos. O país já é o maior exportador de celulose do mundo, e o segundo maior produtor, atrás apenas dos Estados Unidos. Dados da consultoria Forest2Market do Brasil mostram que o ramo deve crescer 8% ao ano, principalmente para atender aos mercados chinês, norte-americano e europeu.
A celulose já está consolidadano topo dos produtos semifaturados da economia baiana. Em 2018, as vendas do produto representaram 17% do total das exportações do estado, segundo o Ministério do Comércio Exterior. Na balança comercial brasileira, a matéria-prima, produzida a partir de árvores plantadas, dividiu o pódium com a soja.
“Apesar da calmaria na economia, foi um ano de muito movimento para o setor, com melhoria dos preços e das quantidades exportadas, além de uma significativa junção de duas empresas líderes no Brasil, que são a Fibria e Suzano”, analisa Wilson Andrade, presidente da Associação Baiana das Empresas de Base Florestal (Abaf).
Em 2019, o ramo pode ser ainda mais alavancado por outras cinco cadeias produtivas que precisam de madeira e derivados. A indústria de papel, o setor de construção civil, o de grãos – que pode utilizar cavaco de madeira no processo de aquecimento – e os setores de mineração e de energia, que, entre outras funções, utilizam a biomassa da madeira para acionar caldeiras.
Cerca de 10% das florestas plantadas do Brasil estão na Bahia, elas ocupam 700 mil hectares no estado. A melhoria na logística é um dos principais desafios para 2019.
“Somos muito competitivos dentro da cancela, nas propriedades, mas na hora do embate logístico saímos perdendo. É preciso gerar incentivos fiscais, desburocratizar os licenciamentos, cuidar dos portos e rodovias, o escoamento da produção e os serviços como eletricidade. O que nos dá confiança é o compromisso assumido pelo novo governo brasileiro em realizar estas mudanças, e em atingir a meta de plantar cerca de 12 milhões de hectares de florestas até 2030. Um percentual disso deve ser de florestas produtivas, como pinus e eucalipto. Há um círculo futuro que nos estimula, e indica que teremos anos promissores pela frente, seja para as florestas, seja para as fibras”, explica Andrade.
Segundo a Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), as exportações cresceram 26% entre janeiro e outubro de 2018, gerando 8 bilhões de dólares para o país.
Grãos e cereais
Os grãos, cereais e as chamadas oleaginosas, continuam em alta. Apenas o chamado “complexo soja” aumentou em mais de dois pontos percentuais a participação nas exportações baianas, totalizando 22% de todas as mercadorias enviadas para fora do país este ano.
A soja triturada passou a responder por 17% das exportações, enquanto o farelo e os resíduos da extração de óleo correspondem a 5%. A venda do grão para outros países rendeu a economia baiana US$ 1,35 bilhão este ano.
A soja se consolida como principal commodity brasileira, ultrapassando inclusive os óleos brutos de petróleo, os minérios de ferro e concentrados. Analistas apontam que a guerra comercial entre Estados Unidos e China pode beneficiar a produção brasileira. Os agricultores do Oeste da Bahia estão otimistas quanto a safra de 2019.
“A área de soja está toda plantada, e a condição da lavoura é boa. Torcemos para que continue assim e possamos ter uma boa safra. Estamos otimistas também quanto as demais lavouras, como milho e feijão, onde esperamos aumento da produtividade”, afirma Celestino Zanella, presidente da Associação de Agricultores e Irrigantes do Oeste da Bahia (Aiba).
Entre os entraves enfrentados pelos agricultores destaimensa fronteira agrícola estão as deficiências emserviços essenciais, como energia elétrica. “Nós temos o desafio de conseguir uma distribuição adequada de energia elétrica. Temos pouca energia disponível, menos do que precisamos. É preciso ampliar o sistema de distribuição, mas temos certeza que os governos vão continuar fazendo ações positivas em relação ao oeste”, conclui Zanella.
Os problemas de infraestrutura ainda persistem nesta área do estado. Entre as obras mais urgentes, os produtores rurais esperam a pavimentação de cerca de 200 quilômetros da BR-030, entre Cocos e Jaborandi, e a continuação da BR-020, ligando a Bahia até São Raimundo, em Pernambuco.
Segundo dados da Receita Federal, divulgados esta semana, este ano os agricultores da região pagaram o maior volume de impostos dos últimos sete anos. Os municípios de São Desidério, Formosa do Rio Preto e Correntina, fecharam o ano liderando a lista dos maiores arrecadadores com áreas agrícolas no Oeste da Bahia.
Os agricultores destes três municípios pagaram mais de R$ 17 milhões em impostos. Somando com outros municípios, como Barreiras, Cocos, Jaborandi, Baianópolis, Luís Eduardo Magalhães e Riachão das Neves, a marca de impostos pagos ultrapassa os R$ 26,5 milhões.
“Com essa arrecadação, gostaríamos que as prefeituras revertessem parte desse valor para a manutenção das estradas vicinais firmando, por exemplo, a parceria com Programa Patrulha Mecanizada, que já tem uma estrutura e vem trabalhando com investimento de outros fundos dos agricultores como o Fundeagro e Prodeagro. Alguns municípios como Luís Eduardo Magalhães já são parceiros e vem ampliando a quantidade de estradas recuperadas facilitando o trânsito para todas as pessoas, que moram nas localidades da zona rural e em fazendas, e para o escoamento da safra”, explica Júlio Cézar Busato, presidente da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa).
Seca e chuva excessiva afetam desempenho do setor
O ano de 2018 foi marcado por extremos para os agricultores baianos. Muitos produtores perderam safras devido à seca ou chuva excessiva. Foi assim no nordeste do estado com os produtores de milho e feijão, que viram fracassar mais de 95% das lavouras por causa da severa estiagem. Também é o que está ocorrendo com alguns produtores de uva da região norte do estado, atingidos pelas chuvas torrenciais registradas no fim de novembro.
Já no Oeste, os agricultores colheram excelentes safras. Foram mais de 9,3 toneladas de grãos, cereais e oleaginosas. Um desempenho bem acima das melhores estimativas, e que fez a Bahia subir para a sétima posição no ranking nacional dos maiores produtores de grãos do país, superando São Paulo. A produção de algodão foi a segunda melhor da história, alcançou 1,2 milhão de toneladas de algodão.
O bom desempenho também foi registrado nos cafezais. Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) revelam que a Bahia atingiu o maior volume de produção de café da história. Foram mais de 4,55 milhões de sacas, com produtividade média recorde de 35 sacas por hectare. O uso de tecnologia de irrigação e as mudanças no manejo da lavoura teriam influenciado no resultado.
Cerca de 11% da produção de café saiu do cerrado baiano, 30% do planalto da Conquista e 59% da região sul, da área do chamado café atlântico.
A fruticultura ganhou robustez com a primeira safra produtiva de amoras e framboesas da Chapada Diamantina. Acompanhadas dos tradicionais morangos, estas outras frutinhas vermelhas já podem ser encontradas nos municípios de Mucugê e Barra da Estiva. Outros dois polos se destacaram. O Vale do São Francisco com as uvas e mangas voltadas para exportação, e o Baixo Sul com a diversidade marcante da região de Gandu e Teolândia, que se tornaram grandes produtores de graviola, maracujá e banana da terra.
O censo agro do IBGE revelou um novo perfil da agropecuária do estado:
* Ocupando áreas menores, os agricultores estão produzindo mais, graça a tecnologia.
* Os homens ainda são maioria da administração das propriedades, mas as mulheres avançaram nos postos de comando e já ocupam 25,6% da gestão das propriedades rurais.
* Já na infraestrutura e na educação, os dados continuam preocupantes. Cerca 32% dos produtores rurais que ocupam postos de comando são analfabetos, um em cada quatro estabelecimentos agropecuários não tem energia elétrica, e 75,9% não tem acesso a internet.
* Ferrovias inacabadas, estradas não pavimentadas e falta de assistência técnica, completam o balanço negativo dos problemas que atrapalham o avanço do setor.
Agricultura familiar vem perdendo espaço na Bahia
Dados da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI) revelaram que a agricultura familiar vem perdendo espaço na Bahia. Segundo o último levantamento realizado entre 2010 e 2015, e só divulgado este ano, a participação da agricultura familiar caiu de 43,2% para 32,4% na estrutura da agropecuária baiana.
A seca e a expansão da agricultura comercial, voltada para a produção de commodities, são apontadas como fatores desta redução. Junta-se a isso a crise econômica e política que afetou o Brasil nos últimos anos.
Os especialistas e representantes do segmento defendem a oferta de mais recursos do governo federal para os pequenos agricultores, e a flexibilização dos bancos na liberação de crédito para capital de giro.
“O principal desafio para 2019 é ajudar o agricultor a se organizar, para que ele possa fortalecer a gestão do negócio, se consolidar no mercado, beneficiar os produtos e passar a ser fornecedor. É preciso incentivar a implantação de agroindústrias. O agricultor já sabe que através de associações e cooperativas ele pode ganhar mercado, agregar valor e produzir alimentos mais saudáveis com base na agroecologia. Temos a disposição do governo do estado para aumentar estes recursos e dar continuidade a estes investimentos”, afirma Jerônimo Rodrigues, secretário de Desenvolvimento Rural da Bahia.